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Servidora, mãe e artesã: quem era Vanessa Salm, 1ª vítima da Covid-19 em Blumenau

— Ela abria mão de vontades dela para dar algo aos filhos. Trabalhava muito, sempre correndo, inventando mil coisas. Vendia artesanato, mas doava também, recolhia roupas para os mais pobres… Se soubesse que ao deixá-la na porta do hospital nunca mais conversaríamos, teria dito mais coisas.

As palavras são de Jaison Salm, 40, marido de Vanessa Neuber Salm, 34, primeira moradora de Blumenau a perder a vida para o novo coronavírus. Jaison foi chamado no começo da manhã desta terça-feira (5) pela equipe do Hospital Santa Isabel, onde a técnica de enfermagem estava internada há 29 dias em um leito de UTI. Vanessinha, como era conhecida pelos colegas de trabalho, deixa três filhos – um de 17 anos e gêmeos de seis – o esposo e dezenas de pessoas que a admiravam pela força e bondade.

Servidora no Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD), Vanessa gostava do que fazia. Apesar da artrite, uma doença autoimune que ataca as articulações, tentava se afastar o menos possível. Algumas internações decorrentes do problema foram inevitáveis nos últimos anos, mas nada que pudesse desanimá-la.

Criativa e sorridente, fazia artesanatos para conseguir uma renda extra e quitar o imóvel que comprou com o marido próximo à residência dos sogros, na região do bairro Velha. Há poucos meses o sonho da casa própria parou de pesar no bolso, mas Vanessa não teve tempo para aproveitar. A máquina que adquiriu para estampar canecas e camisas com o filho mais velho tampouco chegou a ser usada.

Jaison conta que a esposa tinha parado de ir ao Caps poucos dias antes dos primeiros sintomas da Covid-19 surgirem. A prefeitura afastou todos os profissionais dos grupos de risco no começo da pandemia. Porém, o pai de Jaison, o ex-vereador Vânio Salm, 69, apresentou alguns sinais, como febre e dor no corpo. Mesmo sem fazer o teste, recebeu medicamentos e foi isolado. Toda a família, apesar de vizinha, respeitou a quarentena.

Vanessa sabia da importância do distanciamento. Nas redes sociais, pediu: “fiquem em casa”. Ela saiu algumas vezes, tomando todos os cuidados, para entregar algumas encomendas de artesanato e fazer exames por conta da artrite. Em uma dessas idas ao hospital sentiu-se ainda mais indisposta. Voltou para casa, cuidou dos filhos e, com tosse e dificuldade de respirar, pediu para Jaison levá-la ao Santa Isabel. Ao deixá-la na porta da unidade, jamais imaginou que a despedida seria para sempre.

— Ontem (segunda-feira) eles me pediram para preparar as crianças. Elas fizeram cartinhas e eu levei ao hospital. Um dos gêmeos pediu para o médico não desistir. O outro desenhou uma barraca e disse que a ama. Eu passei a noite rezando — conta o marido.

No final do ano passado a família acampou o que, claro, fez a alegria dos mais novos. Vânio lembra que apesar das inúmeras atividades, seja com o Caps, com questões sindicais, artesanato ou no grupo de doações de produtos aos mais pobres que Vanessa participava, os filhos estavam sempre em primeiro plano.

— Eu sempre vou lembrar da dedicação dela com os filhos, do esforço, mesmo doente, para cuidar deles —, emociona-se o sogro, que agora, junto com a esposa, ajudará o filho a cuidar dos meninos.

Lutas diárias

Vânio conta que Vanessa entrou para a família como a filha que eles não tiveram. Órfã de pai e mãe, a jovem construiu novos laços com os parentes do marido e com os amigos que fez ao longo da vida. Formou-se como técnica quando já tinha o primogênito, que foi diagnosticado com Transtorno do Espectro do Autismo.

Com amor, mas muita firmeza, enfrentou as dificuldades para ajudar o desenvolvimento do rapaz. Os gêmeos vieram de surpresa, enquanto a servidora tratava uma complicação da artrite, que descobriu há cerca de dez anos.

​Foram alguns procedimentos para amenizar as consequências da doença, mas há dois anos já não passava por uma internação. Pelo histórico de lutas vencidas em hospitais, todos achavam que Vanessa sairia bem dessa nova batalha. No entanto, o coronavírus atacou os pulmões que já possuíam uma lesão e contribuiu para infecções em outros órgãos.

Ao saber da notícia da morte, Jaison teve a missão de contar aos filhos. Uma das crianças, ao ver o semblante do pai, colocou as mãos na cabeça e antecipou: “Eu espero que não seja coisa ruim”.

— Escutem os médicos, não esses loucos que dizem que o coronavírus é uma brincadeirinha. Dá vontade de chorar quando ouço essas coisas no jornal, porque somos tão pequenos e não podemos fazer nada. O capital recuperamos, a vida não — desabafa Vânio.

Última despedida

Uma cerimônia está marcada para às 9h desta quarta-feira (6) na Igreja Santa Cruz, bairro Velha. O último adeus ocorrerá do lado de fora, para evitar aglomeração em local fechado. Após uma rápida despedida, o enterro será no cemitério da igreja.

Representantes do Sintraseb, sindicato dos servidores do município, farão uma homenagem à jovem mulher. “Vanessa era uma profissional reconhecida na rede por seu jeito atencioso, simpático e meigo, e sempre esteve presente nas lutas da categoria” escreveu a entidade.

Em nota, o Conselho Regional de Enfermagem de Santa Catarina lamentou a primeira morte de uma profissional da área no estado.

Fonte: NSC Total



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