A sociedade contemporânea enfrenta desafios sem precedentes devido à pandemia. Todos os setores, de algum modo, têm sofrido os efeitos colaterais provocados pelo Covid-19. Economia, agricultura, comércio, transporte, entre outros tantos. Nas reflexões que seguem, atentar-me-ei à educação, área profissional em que atuo e que tem me desafiado tanto em pesquisas, leituras, planejamentos e demais ações pedagógicas a fim de amenizar os impactos causados pelo afastamento das crianças e dos estudantes da Educação Básica das escolas. Os professores e as famílias dos estudantes estão diretamente relacionados e são afetados pelo cenário que está posto.
Óbvio está que ninguém simplesmente escolheu tal situação; ela apenas se instaurou afetando e modificando a rotina dos nossos dias, reestruturando nossos horários, afazeres, revelando limitações, mas, também, exigindo a aprendizagem de novas formas de lidar com tudo isso – em todos os setores e funções. O fato é que não podemos agir do mesmo modo como fazíamos e quando tudo isso passar, não seremos mais os mesmos. O conhecimento seguramente é o aliado que acalenta as nossas angústias, mas, não basta que esteja apenas disponível, é preciso, também, desejar-querer acessá-lo.
Nessa ótica, uma função antes relegada apenas à escola por um significativo número de famílias, agora é compartilhada. Digo algumas famílias, porque antes do ensino remoto já existiam as famílias relapsas para com o acompanhamento da aprendizagem e algumas delas assim também têm permanecido nesse período de aulas no formato remoto – não presencial. Há por outro lado as famílias que antes já se faziam presentes e estas assim permanecem, dedicando-se dentro das possibilidades e das limitações de cada uma para ajudar seus filhos a superarem juntos esse momento complexamente inovador.
Como professor tenho me surpreendido com a dedicação de muitas famílias de meus estudantes no apoio a eles oferecido. Ouso dizer que tenho me aproximado muito mais virtualmente de algumas famílias por meio do grupo de WhatsApp da turma que antes presencialmente. Estamos, agora, “disponíveis” em tempo real, mas, do outro lado da telinha. Ainda que isso soe agradável aos ouvidos do leitor – e de fato o é a partir da experiência que tenho tido e, certamente, manterei o grupo mesmo depois do retorno das aulas – há questões presentes nas entrelinhas que precisam ser pensadas. O estar disponível reestrutura a rotina pessoal e profissional do professor, os horários são relativizados, as dificuldades com a linguagem e o lidar com os recursos tecnológicos são revelados constantemente, pois, como já proferido pela mídia social, não somos youtubers, não fomos formados para isso e nem possuímos os recursos tecnológicos adequados para isso. Fazemos o melhor que podemos com o que temos. E o mesmo ocorre com as famílias dos estudantes quando nos dão a devolutiva das atividades por meio dos grupos de Whats. Sim, nós disponibilizamos nossos números de celulares, nossa internet, nosso computador, nossa energia para ajudarmos a prosseguir com a educação remota não presencial que está posta. Há quem diga que não estamos fazendo mais que a obrigação! Para estes, com o coração transbordando de orgulho, digo que estamos fazendo muito, muito mais do que antes fazíamos.
O que está claro é que, por hora, precisamos fazer o melhor que podemos em prol da continuidade do processo educativo, ainda que sob um molde nunca antes vivido. Os estudantes necessitam manter o vínculo com a escola, com a rotina que envolve leitura, escrita, pesquisa… precisam continuar acreditando na escola, assim como suas famílias, pois, manter viva a cultura escolar é a garantia de, no futuro, ampliarmos os nossos horizontes culturais, científicos, profissionais, visto que o aprender de modo contínuum é premissa da sociedade contemporânea. Não há como desconsiderar isso!
Desse modo, um dos grandes desafios para este ano está em não deixarmos os estudantes e as famílias perderem o vínculo com a aprendizagem e com a escola. É claro que por mais que todos nós estejamos fazendo o melhor que podemos, viveremos os efeitos colaterais desse afastamento e desse afrouxamento dos conteúdos escolares. Estamos com uma geração toda em alerta! Em cada turma há uma readaptação de atividades, conteúdos… da Educação Infantil ao Ensino Médio. Cada turma carregará esse déficit para a turma do ano seguinte… Por isso, se não houver o máximo de dedicação, ano que vem continuará a ladainha do afrouxamento, porque não estão dando conta e será assim até concluírem o ciclo da sua escolarização. É preciso pensar acerca do quanto terão deixado de aprender ao final do 9º ano, por exemplo, se a cada ano se viver “um tanto faz”?!…
Diante de tudo isso e de muito mais que não foi aqui explicitado, mas que é vivido diariamente por cada uma das famílias de nossos estudantes, de modo peculiar, é preciso seguir. Então, que esta caminhada seja trilhada com parceria, que possamos encontrar redes de apoio entre sociedade, escola, família e estudantes para que, quando retomarmos a rotina presencial da escola, estejamos fortalecidos para enfrentarmos com qualidade, ciência e responsabilidade os desafios do porvir, visto que antes da pandemia também já enfrentávamos problemas. Logo, os de agora não podem ser considerados exclusividade gerada apenas pelo Covid-19; eles revelam, sobretudo, a fragilidade de nossas políticas públicas e investimentos para qualificar a formação dos sujeitos ao longo dos anos, a fim de tornar os processos de ensino e de aprendizagem contemporâneos a seu tempo.
Leomar Kieckhoefel
Professor dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino de Massaranduba – SC; Mestre em Educação: Interdisciplinaridade e Formação de Professores – UNICID (2007); Especialização em Pedagogia Gestora, com Ênfase em Administração, Supervisão e Orientação Educacional – ACE (2004); Especialização em Educação Escolar Contemporânea – UFSC (2019); Especialização em Psicopedagogia Institucional e Clínica – UNIBF (2019); Graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário de Jaraguá do Sul/SC – UNERJ (2004).